Compaixão como força transformadora

 


O primeiro atributo de Deus certamente não é o poder. Não quero aqui frustrar os que defendem que este atributo seja o mais importante porque o apresenta como um ser que tem em si mesmo a capacidade de tudo fazer e acontecer. Para estes, Deus seria então a potência em si mesmo, não dependendo de nada, existindo na plena autossuficiência. 

Talvez isso seja adequado e aceitável numa perspectiva da Escolástica, mas não no contexto do Evangelho deste domingo. Lembremos que no verso 36, do capítulo 9 de Mateus aparece o sentimento da compaixão como aquele que impele Jesus na direção das pessoas. E sente compaixão porque reconhece que as pessoas andavam cansadas e sentindo a ausência de um pastor. 

Voltando à comparação entre poder e compaixão, percebe-se que o poder está associado à masculinidade, pois a história dos machos sempre contempla uma conexão atávica com força e imposição. A compaixão, por outro lado, está associada à feminilidade, contemplando a capacidade de se projetar na direção de quem tem necessidades  para transformar e ressignificar a vida.

Não vou aqui me arriscar a aprofundar a discussão sobre masculinização/feminilização de Deus, mas desejo aplicar a compaixão como a mola que projeta Jesus para as necessidades das pessoas e como essa mola é essencial para que a missão aconteça. 

Jesus envia seus discípulos para anunciar o reinado de Deus que nada mais do que a boa notícia para quem precisa. Estas pessoas destinatárias são exatamente aquelas que estão excluídas do sistema. São as pessoas despossuídas de direitos, de dignidade, exatamente como aquelas que no Egito estavam escravizadas e cujo lamento Deus escutou, e promoveu a sua libertação. É este mesmo Deus que, em Jesus, comissiona discípulos e discípulas para cuidar da sua seara, de seu rebanho.

Estamos dispostos a aceitar esse comissionamento? Ele tem um custo elevado porque nos coloca diante de um sistema que oprime, que exclui e que mata. Um sistema que gera lágrimas e sofrimento à rodo. Mantido por pessoas poderosas e violentas. Pessoas que não estão nem aí pro Deus que liberta! Até algumas dessas pessoas podem se dizer religiosas, mas realmente apenas servem-se a si mesmas! São essas pessoas que se interpõem no caminho, tentam atrapalhar ao máximo, mas não prevalecerão, pois a compaixão materna de Deus é mais forte que a morte!

Extrato de sermão proferido na Christ Church, Belleville, em 18.06.2023


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