Até quando rirão de nossa cara?

É impressionante como a sociedade brasileira está precisando de um choque de realidade diante da avassaladora institucionalização da corrupção. Me recordo que quando fiz parte do Conselho de Transparência e combate à Corrupção, ligado à CGU - Controladoria Geral da União - ali representava a ABONG (Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais) - um dos pontos mais cruciais de nosso trabalho era a elaboração de políticas que buscassem reduzir ao máximo desejável os desvios de recursos públicos. À época, ficávamos impressionados com o número de casos de prestações de contas suspeitas de prefeituras e de estados no manejo dos recursos oriundos de repasses federais. O trabalho da CGU em muito tem contribuído para expor as fragilidades de controles racionais e a prova disso é que o número de casos denunciados aos órgãos judiciais aumentou sensivelmente na última década. Evidente que falta a outra ponta do processo, exatamente aquela que responsabiliza e pune efetivamente os agentes públicos, que ainda está envolta em meandros processuais tortuosos, protelatórios e de poucos efetivos resultados. Diante disso, corruptores de um lado e corruptíveis de outro dançam em perfeita harmonia uma macabra música que lesa a cidadania brasileira e empobrece ainda mais os mais pobres e subtrai a dignidade de milhões de brasileiros. As cenas de sarcasmo que assistimos no último domingo enojam qualquer um. Sanguessugas imorais - engravatados ou não - e uma piriguete (ao melhor estilo) desfilaram acintosamente seu desdém pela racionalidade e moralidade das instituições brasileiras. Usaram expressões como "ética", "lei", "normalidade", entre outros institutos com uma frieza inconcebível de quem está totalmente desprovido de qualquer sensibilidade cidadã. Como disse uma autoridade do governo, o que se viu ali, considerando que tratava-se de contratos negociados na esfera da saúde, representa simplesmente o custo de vidas humanas que dependem da saúde no Brasil. Dinheiro que poderia representar mais leitos, melhores serviços, mais profissionais, enfim, uma saúde de melhor qualidade num país onde as pessoas que precisam do sistema único de saúde engrossam filas e morrem literalmente no chão de nossos hospitais. O que vimos é apenas uma pequena amostra do que acontece diariamente nos processos de licitação para compra de serviços entre hospitais e fornecedores. Está na hora da sociedade brasileira dar um inequívoco basta a esta prática criminosa. As leis e sua aplicação precisam eliminar de vez a cultura de impunidade que impera neste país. Desvio de recursos públicos não pode ficar mais restrito apenas ao campo dos crimes contra o patrimônio público ou equivalentes contra o sistema financeiro. Não podem ter penas leves e nem fiança. Devem se equivaler ao nível dos crimes hediondos. Somente a sociedade organizada pode enfrentar o crime organizado. O povo brasileiro não pode continuar assistindo a esse descalabro. Assim como foi capaz de iniciativa legislativa para criar a Ficha Limpa, pode ser capaz de criar a lei da Tolerância Zero contra a corrupção. Não podemos ser tolerantes para com aqueles que se apropriam do suado imposto que pagamos honestamente.

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