O Velho Chico e a saga do Bispo contra o Presidente

Nestes tempos de fraca institucionalidade, com a crise reduzindo a força das instituições democráticas do País, o gesto do Bispo de Barras, D. Luis Flávio Cappio, traz à tona algumas questões que precisam ser analisadas com muita atenção.
A radicalidade do gesto do Bispo, ao iniciar uma greve de fome em protesto contra a transposição do São Francisco, colocou em cheque a máquina do Governo. Conseguiu fazer o que não conseguiram os movimentos sociais que reclamavam do Presidente uma postura de diálogo em torno do Projeto.
Aliás, diálogo é uma palavra que tem sido muito cobrada por parte da Sociedade Civil organizada com relação a iniciativas do Governo em áreas de elevado interesse dos segmentos populares. E onde houve diálogo, ou melhor, tentativas, nem sempre prevaleceu a reivindicação das organizações e movimentos sociais. Um exemplo disso foi a discussão do PPA, culminando com uma proposta elaborada pelos tecnocratas ligados à filosofia da priorização dos fundamentos macro-econômicos.
Mas alguém pode perguntar porque o gesto de um bispo lá do interior da Bahia teve tanto impacto sobre o Governo. A resposta é simples: ele representa de certa forma uma das instituições mais fortes politicamente e com a qual o Governo não quer confronto. A adesão política dos movimentos sociais à greve do Bispo poderia funcionar como fogo em palha e transformar o fato em um enorme constrangimento para o Presidente.
Daí o recuo. Mas é bom ficar de olhos bem abertos porque o jogo de interesses econômicos em torno do Projeto vai ser outra grande pressão sobre o Governo.
As declarações do ministro Jaques Wagner de que o Governo não desistiu do Projeto, mas apenas adiou sua execução para uma discussão mais ampla, pode ser um claro recado de que o fato foi administrado politicamente para ser retomado com toda força em um momento mais adequado.
Só que issso tem riscos enormes para o Presidente. Se o Governo voltar atrás na questão, e impuser como fez até a greve de fome do Bispo, um projeto megalomaniaco de duvidosa eficácia para a solução dos graves problemas que afetam a região nordeste, poderá se defrontar não com um bispo em greve de fome outra vez, mas com uma romaria de militantes religiosos ou não, dispostos a jogar a opinião pública contra um Governo que não cumpre acordos.
Parece que nestes tempos de esvaziamento da força das institucionalidades da democracia brasileira, gestos dessa ordem assumem uma importancia enorme. E nessa pisada, se a moda pega, podem haver outros movimentos nesta direção, como por exemplo na questão da reforma agrária.
O velho Chico, como é chamado o rio, parece demonstrar sua força mítica. E para tanto o seu curso definido pela natureza, destruido pelo homem, torna-se agora objeto de discussão nacional. Em torno de suas águas se confrontam militantes sociais, um bispo corajoso e um Presidente temeroso de perder popularidade!

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